Como iniciar um texto dissertativo.

O PARÁGRAFO-CHAVE: 18 FORMAS PARA VOCÊ COMEÇAR UM TEXTO

Ao escrever seu primeiro parágrafo, você pode fazê-lo de forma criativa. Ele deve atrair a atenção do leitor. Por isso, evite os lugares-comuns como: atualmente, hoje em dia, desde épocas remotas, o mundo de hoje, a cada dia que passa, no mundo em que vivemos, na atualidade.

Listamos aqui dezoito formas de começar um texto. Elas vão das mais simples às mais complexas.

1. Uma declaração (tema: liberação da maconha)

É um grave erro a liberação da maconha. Provocará de imediato violenta elevação do consumo. O Estado perderá o precário controle que ainda exerce sobre as drogas psicotrópi¬cas e nossas instituições de recuperação de viciados não terão estrutura suficiente para aten¬der à demanda.

Alberto Corazza, /stoé, 20 dez. 1995.

A declaração é a forma mais comum de começar um texto. Procure fazer uma declaração forte, capaz de surpreender o leitor.

2. Definição (tema: o mito)

O mito, entre os povos primitivos, é uma forma de se situar no mundo, isto é, de encontrar o seu lugar entre os demais seres da natureza. É um modo ingênuo, fantasioso, anterior a toda reflexão e não-crítico de estabelecer algumas verdades que não só explicam parte dos fenôme¬nos naturais ou mesmo a construção cultural, mas que dão, também, as formas da ação humana.

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda & MARTINS, Maria Helena Pires. Temas de Filosofia.

São Paulo, Moderna, 1992. p. 62.

A definição é uma forma simples e muito usada em parágrafos-chave, sobretudo em textos dissertativos. Pode ocupar só a primeira frase ou todo o primeiro parágrafo.

3. Divisão (tema: exclusão social)

Predominam ainda no Brasil duas convicções errôneas sobre o problema da exclusão soci¬al: a de que ela deve ser enfrentada apenas pelo poder público e a de que sua superação envolve muitos recursos e esforços extraordinários. Experiências relatadas nesta Folha mos¬tram que o combate à marginalidade social em Nova York vem contando com intensivos esfor¬ços do poder público e ampla participação da iniciativa privada.

Folha de S.Paulo, 17 dez. 1996.

Ao dizer que há duas convicções errôneas, fica logo clara a direção que o parágra¬fo vai tomar. O autor terá de explicitá-las na frase seguinte.

4. Oposição (tema: a educação no Brasil)

De um lado, professores mal pagos, desestimulados, esquecidos pelo governo. De outro, gastos excessivos com computadores, antenas parabólicas, aparelhos de videocassete. É este o paradoxo que vive hoje a educação no Brasil.

As duas primeiras frases criam uma oposicão (de um lado/de outro) que estabelecerá o rumo da argumentação.

Também se pode criar uma oposição dentro da frase, como neste exemplo:

Vários motivos me levaram a este livro. Dois se destacam pelo grau de envolvimento: raiva e esperança. Explico-me: raiva por ver o quanto a cultura ainda é vista como artigo supérfluo em nossa terra; esperança por observar quantos movimentos culturais têm acontecido em nossa história, e quase sempre como forma de resistência e/ou transformação. (ou)

FEIJÓ, Martin César. O que é política cultural. São Paulo, Brasiliense, 1985. p. 7.

O autor estabelece a oposição e logo depois explica os termos que a compõem.

5. Alusão histórica (tema: globalização)

Após a queda do Muro de Berlim, acabaram-se os antagonismos leste-oeste e o mundo parece ter aberto de vez as portas para a globalização. As fronteiras foram derrubadas e a economia entrou em rota acelerada de competição.

O conhecimento dos principais fatos históricos ajuda a iniciar um texto. O lei¬tor é situado no tempo e pode ter uma melhor dimensão do problema.

6. Uma pergunta (tema: a saúde no Brasil)

Será que é com novos impostos que a saúde melhorará no Brasil? Os contribuintes já estão cansados de tirar dinheiro do bolso para tapar um buraco que parece não ter fim. A cada ano, somos lesados por novos impostos para alimentar um sistema que só parece piorar.

A pergunta não é respondida de imediato. Ela serve para despertar a atenção do leitor para o tema e será respondida ao longo da argumentação.

7. Uma frase nominal seguida de explicação (tema: a educação no Brasil)

Uma tragédia. Essa é a conclusão da própria Secretaria de Avaliação e Informação Educa¬cional do Ministério da Educação e Cultura sobre o desempenho dos alunos do 3º ano do 2º grau submetidos ao Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica), que ainda avaliou estu¬dantes da 4ª série e da 8ª série do 1º grau em todas as regiões do território nacional.

Folha de S.Paulo, 27 novo 1996.

A palavra tragédia é explicada logo depois, retomada por essa é a conclusão.

8. Adjetivação (tema: a educação no Brasil)

Equivocada e pouco racional. Esta é a verdadeira adjetivação para a política educacional do governo.

Anderson Sanches, Infocus, n. 5, ano 1, out. 1966. p. 2.

A adjetivação inicial será a base para desenvolver o tema. O autor dirá, nos pará¬grafos seguintes, por que acha a política educacional do governo equivocada e pou¬co racional.

9. Citação (tema: política demográfica)

"As pessoas chegam ao ponto de uma criança morrer e os pais não chorarem mais, traze¬rem a criança, jogarem num bolo de mortos, virarem as costas e irem embora." O comentário, do fotógrafo Sebastião Salgado, falando sobre o que viu em Ruanda, é um acicate no estado de letargia ética que domina algumas nações do Primeiro Mundo.

DI FRANCO, Carlos Alberto. Jornalismo/ ética e qualidade. Rio de Janeiro,

Vozes, 1995. p. 73.

A citação inicial facilita a continuidade do texto, pois ela é retomada pela palavra comentário da segunda frase.

10. Citação de forma indireta (tema: consumismo)

Para Marx a religião é o ópio do povo. Raymond Aron deu o troco: o marxismo é o ópio dos intelectuais. Mas nos Estados Unidos o ópio do povo é mesmo ir às compras. Como as modas americanas são contagiosas, é bom ver de que se trata.

Cláudio de Moura e Castro, Veja, 13 novo 1996.

Esse recurso deve ser usado quando não sabemos textualmente a citação. É me¬lhor citar de forma indireta que de forma errada.

11. Exposição de ponto de vista oposto (tema: o provão)

O ministro da Educação se esforça para convencer de que o provão é fundamental para a melhoria da qualidade do ensino superior. Para isso, vem ocupando generosos espaços na mídia e fazendo milionária campanha publicitária, ensinando como gastar maio dinheiro que deveria ser investido na educação.

Orlando Silva Júnior e Eder Roberto Silva, Folha de S.Paulo, 5 novo 1996.

Ao começar o texto com a opinião contrária, delineia-se, de imediato, qual a posição dos autores. Seu objetivo será refutar os argumentos do opositor, numa espécie de contra-argumentação.

12. Comparação (tema: reforma agrária)

O tema da reforma agrária está presente há bastante tempo nas discussões sobre os pro¬blemas mais graves que afetam o Brasil. Numa comparação entre o movimento pela abolição da escravidão no Brasil, no final do século passado e, atualmente, o movimento pela reforma agrária, podemos perceber algumas semelhanças. Como na época da abolição da escravidão existiam elementos favoráveis e contrários a ela, também hoje há os que são a favor e os que são contra a implantação da reforma agrária no Brasil.

OLIVEIRA, Pérsio Santos de. Introdução à sociologia. São Paulo, Ática, 1991. p. 101.

Para introduzir o tema da reforma agrária, o autor comparou a sociedade de hoje com a do final do século XIX, mostrando a semelhança de comportamento entre elas.

13. Retomada de um provérbio (tema: mídia e tecnologia)

O corriqueiro adágio de que o pior cego é o que não quer ver se aplica com perfeição na análise sobre o atual estágio da mídia: desconhecer ou tentar ignorar os incríveis avanços tecnológicos de nossos dias, e supor que eles não terão reflexos profundos no futuro dos jor¬nais é simplesmente impossível.

Jayme Sirotsky, Folha de S.Paulo, 5 dez. 1995.

Sempre que você usar esse recurso, não escreva o provérbio simplesmente. Faça um comentário sobre ele para quebrar a idéia de lugar-comum que todos eles tra¬zem. No exemplo acima, o autor diz "o corriqueiro adágio" e assim demonstra que está consciente de que está partindo de algo por demais conhecido.

14. Ilustração (tema: aborto)

O Jornal do Comércio, de Manaus, publicou um anúncio em que uma jovem de dezoito anos, já mãe de duas filhas, dizia estar grávida mas não queria a criança. Ela a entregaria a quem se dispusesse a pagar sua ligação de trompas. Preferia dar o filho a ter que fazer um aborto.

O tema é tabu no Brasil. (...)

Antonio Carlos Viana, O Quê, edição de 16 a 22 jul. 1994.

Você pode começar narrando um fato para ilustrar o tema. Veja que a coesão do parágrafo seguinte se faz de forma fácil: a palavra tema retoma a questão que vai ser discutida.

15. Uma seqüência de frases nominais (frases sem verbo) (tema: a impunida¬de no Brasil)

Desabamento de shopping em Osasco. Morte de velhinhos numa clínica do Rio. Meia centena de mortes numa clínica de hemodiálise em Caruaru. Chacina de sem-terra em Eldorado dos Carajás.

Muitos meses já se passaram e esses fatos continuam impunes.

O que se deve observar nesse tipo de introdução são os paralelismos que dão equilíbrio às diversas frases nominais. A estrutura de cada frase deve ser semelhante.

16. Alusão a um romance, um conto, um poema, um filme (tema: a intolerância religiosa)

Quem assistiu ao filme A rainha Margot, com a deslumbrante Isabelle Adjani, ainda deve ter os fatos vivos na memória. Na madrugada de 24 de agosto de 1572, as tropas do rei de França, sob ordens de Catarina de Médicis, a rainha-mãe e verdadeira governante, desencade¬aram uma das mais tenebrosas carnificinas da História. (...)

Desse horror a História do Brasil está praticamente livre. (...)

Veja, 25 out. 1995.

O resumo do filme A rainha Margot serve de introdução para desenvolver o tema da intolerância religiosa. A coesão com o segundo parágrafo dá-se através da palavra horror, que sintetiza o enredo do filme contado no parágrafo inicial.

17. Descrição de um fato de forma cinematográfica (tema: violência urbana)

Madrugada de 11 de agosto. Moema, bairro paulistano de classe média. Chope ria Bodega - um bar da moda, freqüentado por jovens bem-nascidos.

Um assalto. Cinco ladrões. Todos truculentos. Duas pessoas mortas: Adriana Ciola, 23, e José Renato Tahan, 25. Ela, estudante. Ele, dentista.

Josias de Souza, Folha de S.Paulo, 30 set. 1996.

O parágrafo é desenvolvido por flashes, o que dá agilidade ao texto e pretende a atenção do leitor. Depois desses dois parágrafos, o autor fala da origem do movi¬mento “Reage São Paulo”.

18. Omissão de dados identificadores (tema: ética)

Mas o que significa, afinal, esta palavra, que virou bandeira da juventude? Com certeza não é algo que se refira somente à política ou às grandes decisões do Brasil e do mundo. Segundo Tarcísio Padilha, ética é um estudo filosófico da ação e da conduta humanas cujos valores provêm da própria natureza do homem e se adaptam às mudanças da história e da sociedade.

O Globo, 13 set. 1992.

As duas primeiras frases criam no leitor certa expectativa em relação ao tema que se mantém em suspenso até a terceira frase. Pode-se também construir todo o pri¬meiro parágrafo omitindo o tema, esclarecendo-o apenas no parágrafo seguinte.